quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Didática

Métodos de Alfabetização
Rubens Portugal

De vez em quando, penso como eu gostaria que me vissem: eu gostaria que me vissem como alguém que procura descobrir a causa da causa da causa. Assim, se alguém inventar de me dar algum presente, já sabe o que eu mais aprecio...

Isso vem a propósito da polêmica da alfabetização. Corri e comprei a terceira e última edição do livro do Capovilla, “Alfabetização, método fônico”. (Memnon Edições Científicas). Mergulhei e senti que a discussão está aquecida para além da temperatura razoável.

Na sétima página da apresentação, o leitor fica sabendo que há três contendores na arena: o antigo método alfabético-silábico (o avô do método fônico), o método construtivista (Emília Ferreiro) e o método fônico. Neste momento da batalha, os defensores do método fônico afirmam que o fracasso brasileiro é culpa dos construtivistas.

Investigação
Procurando as causas das causas das causas, vejo diversas causas para o nosso fracasso no processo de alfabetização. Não dá, portanto, para atribuir toda a catástrofe aos construtivistas.

Há oitenta ou cem anos atrás, os brasileiros eram muito melhor alfabetizados do que agora? Sim. Em 1920, o Estado de São Paulo – que tinha a melhor educação pública – só atendia 28% da demanda. Essa minoria (muito bem alfabetizada) tinha como professores pessoas das classes letradas que educavam crianças oriundas também das classes letradas. O método provavelmente era o da velha cartilha, que adotava o avô do fônico, ou seja, o método alfabético-silábico. “Provavelmente”, repito, porque ninguém pode ter certeza de qual método estavam empregando em 1906, por exemplo. É possível que cada alfabetizador tivesse lá os seus segredos.

Dentre as muitas causas está justamente uma das poucas vitórias que podemos alardear agora, em 2006: há vagas para todas as crianças. É preciso lembrar que em 1981 tínhamos sete milhões de crianças que nem chegavam perto de qualquer tipo de escola. Isso foi há 25 anos. E, naquele mesmo ano, a Unesco se espantou porque não tínhamos pré-escola. Então, nestes últimos 25 anos só pudemos cuidar da quantidade de vagas. Um notável esforço quantitativo, e não qualitativo, porque não seria possível trocar o pneu do ônibus em movimento.

O método construtivista – de verdade – deve ter sido adotado em poucas escolas, principalmente particulares, pois são as que conseguem fazer experimentos duradouros, com continuidade.

Muito antes de se ouvir falar em Emília Ferreiro, já se estava pregando, no Brasil, a alfabetização que deveria partir de parágrafos complexos e completos, alegando que as crianças seriam possuídas pelo sentido do texto antes de tentar decifrar o código das letras. Essa foi mais uma das causas das causas. E isso não se chamava construtivismo. Dizia-se que ensinar vogal por vogal era coisa muito medíocre, anacrônica.

Qual a causa mais culpada?
Talvez a presunção de querer ser moderno sem antes preparar professores para essa missão tão importante. Talvez. Mas penso que ninguém está em condições de afirmar nada de forma definitiva ou radical, pois esse é um daqueles fenômenos que têm muitas e fugidias causas.

Conhecendo e trabalhando com professores alfabetizadores, raramente encontrei algum que fosse realmente profundo conhecedor do construtivismo. Discursos, sim, encontrei muitos. Sem fundamento. Por isso, não penso que podemos culpar nenhuma das correntes, estilos, métodos. Quando a porta da sala de aula se fecha, ninguém sabe qual o método que será usado. Provavelmente, é aquele com que a alfabetizadora foi alfabetizada. Só se minha avó era construtivista.


É doutor em Planejamento e Aplicações Militares, professor do curso de pós-graduação em Gestão de Assuntos Públicos da PUC–PR, consultor, palestrante e pesquisador.


www.profissaomestre.com.br

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